Qual o significado de um dia? O dia útil é útil para quem? Patrícia Portela não escreve estas perguntas com estas palavras. Mas ao ler este conjunto de textos-performance, cada um batizado com o nome de um dia da semana, talvez você saia com estas e mais perguntas. Estes monólogos, solilóquios, discursos ecoam a experiência dramatúrgica de Patrícia e perecem pedir, a cada vírgula, a cada declaração, a cada quebra de linha, uma voz que dê corpo a essas pessoas anônimas (como nós) que evidenciam pelo humor, pelo patético, mas também pela dor, uma rotina que parece com “ver um filme na televisão que, apercebo-me a meio, já vi, mas sem forças para mudar de canal”.
A verdade é que, assim como para o sentido da vida (essa busca sem sentido), não haverá resposta única para o valor dos dias úteis ou inúteis – e, quem sabe, não haverá resposta.
Se não há respostas para nós que estamos “à deriva por este século como se fosse o último”, as epígrafes dos textos – a maioria citações da literatura brasileira – podem ser uma das tantas chaves interpretativas destes Dias úteis. A começar pela referência à máquina do mundo de Drummond, que abre o Prefácio fora de jogo, texto que, embora se diga prefácio, é mais uma construção fantástica e inclassificável. É uma performance textual que nos tira do lugar de leitores de prefácios e nos põe diante de um jogo que pode ser tudo, que pode ser a qualquer momento, que pode ser decisivo e, no entanto, talvez não nos apercebamos dele. Talvez o joguemos sem jogar e, como lemos em Drummond, assim repelimos a máquina do mundo que se abre diante de nós a cada vez que o jogo recomeça.
Serão esses os dias úteis de Patrícia Portela? Dias em que seguimos, com Drummond, “vagarosos, de mãos pensas”? Segundas-feiras lutando contra insônias; terças-feiras nos autoboicotando usando o ideal para evitar o possível; quartas-feiras em que nos desmanchamos diante da imobilidade e de palavras por dizer; quintas-feiras que são verdadeiras migrações ou epopeias ao redor de nós mesmos; sextas-feiras em que o planeta nos lembra que é “uma coisa sem sentido que ambiciona acompanhar-te”; ou sábados com uma dor que não passa e “escuridão suficiente para nós”?
Ou talvez estes dias úteis aqui sejam máquinas do mundo se entreabrindo. Para não repelir seus “absurdos originais e seus enigmais”, o negócio é ler e viver um a um.
Reginaldo Pujol Filho